Bonito lhe parece
Eu gosto de coisas feias, assim como também de coisas bonitas, depende das coisas, já dizia a personagem Quitéria (Olívia Araújo) no clássico atemporal Domésticas.
Lembro da vez que estava passeando pelo shopping, olhando vitrines como fazem adolescentes, quando vi uma bota horrenda. Uma bota de couro marrom marmorizado, de salto grosso e bico quadrado. Parei para comentar com minha amiga, "olha essa bota, credo!" e, minutos depois, saía da loja com ela numa sacola. Era tão feia, mas ao mesmo tempo tão imponente em sua feiura, que acabei comprando; e usei até a sola furar. Com ela, fiz looks marcantes, caminhei confortavelmente até o metrô durante os anos de estágio, aguentei em pé festas chatíssimas e pude guardá-la na memória de forma a ser visitada pela mesma em pensamentos que tive no banho.
Um dia, na manicure, troquei um esmalte vermelho de sempre por um tom meio verde-vômito. Ficou ótimo, adorei, casou super bem com meu tom de pele. Só que até hoje a Viviane, que faz minhas unhas, não superou a escolha. Virou uma piada entre nós enviar notícias da "cor mais feia do mundo", e ela sugerir que vai comprar mais esmaltes em tons medonhos só para mim. Afinal, qual é a cor bonita que se passa nas unhas?
Meus interesses românticos nunca tiveram rostos com proporção áurea, e já me peguei repetindo "Que pessoa pavorosa! Estou apaixonada!" mais vezes do que gostaria de admitir. Porém, pra mim, elas exultam aquele brilho que atrai e eu não sei que nome dar. Posso chamar de aura, alma, beleza noves fora — elas jogam a isca da esquisitice e eu mordo com gosto.
Meu avô Mario dizia que “feio é muié sem pentêio”, numa frase que denota uma opinião estritamente pessoal. Junto isso à frase da inesquecível Doralice, que dizia “gosto não se discute, disse a velha chupando ranho” para concluir que o que me agrada é o que me agrada e pronto. No entanto, peço perdão pela imagem que a última frase fez formar na sua cabeça. Ela é feia e nisso vamos ter de concordar.
