Eu Penso Muito Nisso — A transição Trio Maravilha-Fofão
Esta é uma cópia descarada de uma das minhas seções favoritas do The Cut, I Think About This a Lot.
A puberdade é uma bosta. Você não é mais criança, mas ainda é vista como uma. Você também ainda não é adolescente, mas sofre como tal. Cresce peitinho, pintinho, pelinho, como aquela capa da Folhinha de 1987. Ao mesmo tempo que você sonha com o dia que o Felipe Folgosi vai te levar pra patinar no Shopping Morumbi, você joga um estojo na cabeça do Ulisses, seu nêmesis da quinta-série, porque ele te chamou de “dârds”.
Com 11 anos, eu não fazia ideia do meu lugar no mundo. Passava tardes dando voltas de bicicleta ao redor de casa, ouvindo fitas cassete de trilhas de novela no meu walkman, quando não estava daninhando em cômodos que não eram os meus, fuçando na coleção de revista pornô que meu pai escondia no quartinho de ferramentas. No fim daquele ano, fiz minha primeira viagem internacional, para a Disney.
Pra mim, a diversão já começava na viagem de avião, embora naquela época eu ainda ficasse bastante enjoada com o movimento. Pegamos o mesmo voo que a recém-estrelada Daniela Mercury, que eu reconheci depois de olhar fixo para a foto dela na minha revista Capricho e, sem um pingo de vergonha na cara, me levantar para perguntar se era a mesma. Era sim: me deu autógrafo e ainda bateu um papo com o meu avô.
Em 1992, não existia muita tecnologia para as massas. Acho que nem tínhamos ainda o PC da família, e em casa vídeo-game era proibido. Então, numa viagem de 9 horas, só me restava ouvir alguma coisa nos canais de música do avião. Quer dizer, esse era o passatempo, mas para uma menina de 11 anos que nem sabe do que gosta direito, o que ouvir? A rádio estilo Alpha FM, com música de VELHO? Notícias, como um ADULTO? Ou o canal infantil? A última opção era a mais segura. Embora a seleção não contasse com os A-listers da minha época (Xuxa, Trem da Alegria, Balão Mágico), oferecendo opções mais do tipo “morreu ou foi pra Record?”, foram horas ouvindo a mesma sequência de canções. E o que até hoje me assola a memória é, em especial, a transição da música “Trio Maravilha”, do grupo homônimo, para a música “Na Língua do P”, do saudoso boneco/humano deformado Fofão.
Trio Maravilha era a opção do Grupo Silvio Santos para as Paquitas da Xuxa. Um trio de mocinhas de cabelos longos e escuros com pesadas franjas, egressas do curso de assistentes de palco da Mara Maravilha, elas prometiam “dar um show” depois de se apresentarem nas primeiras estrofes da música. Inclusive, mais tarde, a Angélica do grupo saiu e tiveram que substituir o nome dela na rima (ficou “e eu me chamo Alê”).
*TRIVIA*: A primeira vez que ouvi a música “Fio Maravilha”, do Jorge Benjor, tocada por uma banda de réveillon no Hotel Alpino, podia jurar que era uma homenagem ao trio da Mara.
Bom, quando a canção das meninas terminava, com a promessa de que “(se um gatinho pintar) par ou ímpar vamos tirar!”, na sequência entrava um frevo cantado por Orival Pecini, que todos sabemos ser o criador do Fofão, em que ele dizia que “de cabelo punk e camiseta bem transada/pela calçada o rei do skate vai passar”. Sim, um frevo. Porém, falando de amor e atitude punk e declarações na língua do P feitas durante um suposto assalto (“seu amor eu vou roubar”).
Nunca fui muito fã da Mara pra falar a verdade, e pro subproduto de seu programa eu nem cheguei a dar bola. Assistia como assistia o que estivesse passando. Já o Fofão, seguia à risca a recomendação de minha mãe de “não usar de entretenimento a deficiência alheia”. Tudo bem que décadas depois eu vim a descobrir que ele era, na verdade, um cachorro, mas aí a febre já tinha passado. Eu só me pergunto porque essas melodias tão distintas, em transição de uma para a outra, foram estacionar na minha cabeça, volta e meia tornando a me chamar a atenção. Eram parte de um álbum de memórias, que incluíam também a notícia do assassinato da atriz Daniella Perez e a chegada da minha menarca? Pode ser.
